"Contudo, sinalizaram com clareza a necessidade de haver maior negociação entre o Presidente da República, as diferentes formações políticas e a sociedade civil, no caso específico de se considerar a necessidade de se fazer qualquer revisão à Constituição da República, o que respeitaremos", este era o trecho que devia fazer parte do comunicado final da última reunião do Comité Central do MPLA e que acabou sendo retirado após uma intervenção do "criador" cansado de ver a sua "criatura" ser tomada por apetites de revisionismos. Carlos Feijó soube fazer leituras e percebeu que, se ficasse calado, estaria a ser conivente ou cúmplice daquilo que em determinadas correntes do próprio MPLA tem sido apelidado de "banditismo constitucional". Elucidou o líder sobre os riscos de uma tentativa de revisão constitucional no seu último mandato. Tendo-lhe devolvido a palavra para "melhores explicações".

Há algum tempo que o MPLA está a viver os chamados medos contraditórios. No período pré-eleitoral, havia medo de uma ameaça exterior, que era ACJ e o possível cenário de alternância, mas que está, até 2027, afastada. Mas o maior dos medos contraditórios é interno. Existe hoje, no seio do MPLA, não apenas o medo do uso mas sim do abuso do poder que é conferido ao seu presidente. João Lourenço é politicamente imprevisível e age muitas vezes como um lobo solitário. Os seus auxiliares na estrutura partidária e governativa acabam também surpreendidos pelas suas decisões, ao mesmo tempo que os cidadãos.

As suas decisões são vistas maioritariamente como imposições e, por isso, geram algumas rejeições silenciosas e daí algumas tímidas tentativas de o limitar algumas vezes. A nomeação de uma secretária de Estado para Vice-Presidente da República e de outra para ministra de Estado, o afastamento ou "apagamento" de duas figuras de proa como o antigo presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade "Nandó", e do ex-Vice-Presidente, Bornito de Sousa, são situações que precisam de uma clarificação dentro das estruturas partidárias. As bases estão distanciadas das lideranças e parecem alheias às estratégias adoptadas.

A queda em Luanda, os níveis de abstenção e os resultados eleitorais são sinais mais de demérito da governação do que propriamente de mérito da oposição. Foi um protesto, um sinal para dentro das lideranças do MPLA. Os grupos e guerras internos devem merecer a atenção imediata do líder do partido. É claro que João Lourenço sabe que os " Argelinos" não podem com os "Malanjinos" e que os pretendem "engolir". Essa é uma batalha que fractura o MPLA.

Esses são os medos contraditórios que o MPLA vive neste momento. O partido tem medo de dar excessivos poderes ao seu líder e de criar condições para que ele se perpetue no poder. O líder tem receio de perder poder e de não controlar a máquina do partido. A aposta na continuidade de João Lourenço para lá de 2027 não reúne consenso e assusta. Os 38 anos de governação de José Eduardo dos Santos "queimaram" muitas gerações e há receios de que estes prolongamentos ou extensões no poder voltem a verificar-se. Hoje há muitos elementos no seio do MPLA já na "pole-position" de 2027 e são alguns destes que se negam a servir a Magna "Feijóada" constitucional e revisionista a João Lourenço, propondo-lhe que se vá preparando e habituando para ser vegetariano e evitar certos desarranjos intestinais, ou melhor, constitucionais. Bom apetite!