Chernobyl é a central nuclear situada no norte da Ucrânia que, antes da implosão da URSS, na década de 1980, foi lugar do mais grave acidente nuclear civil de sempre, com centenas de milhares de vítimas e que, agora, depois do anúncio de Vladimir Putin, está a servir para alcunhar a nova arma vista em Moscovo como o "triunfo da ciência russa".
As advertências chegam depois de ser conhecido que este míssil, sobre o qual já havia notícias há anos, está agora pronto para começar a ser produzido depois de um teste em que voou 14 mil kms durante 15 horas, ameaçando qualquer ponto no Planeta Terra.
No entanto, como alguns analistas começam a sublinhar, o anúncio da conclusão dos testes do Burevestnik não coincide por acaso com o anúncio das sanções norte-americanas sobre as maiores empresas petrolíferas russas, a Rosneft e a Lukoil, que Putin procurou minimizar alegando que não vão ter efeitos sérios sobre a economia russa e que Donald Trump aproveitou para gozar com o russo, desafiando-o a ver se houve ou não efeitos dentro de seis meses.
Além da questão da coincidência temporal do anúncio das sanções americanas e do fim da fase de testes do novo míssil russo, alguns especialistas, como John Erath, director do Centro para o Controlo e Não-Proliferação de Armas Nucleares, citado por The Guardian, lembram que o Burevestnik tem riscos muito além dos representados pelas ogivas nucleares que carrega,
Sendo um engenho com propulsão nuclear, os riscos de qualquer mau funcionamento podem ser gigantescos, além de que se trata de "pura propaganda" porque não acrescenta nada em termos de dissuasão da tríade nuclear russa, visto que Moscovo já dispõe há décadas de projecteis balísticos de longo alcance com os quais podem atingir qualquer parte do mundo.
E essa é a razão pela qual o Burevestnik começa a ser chamado de "Cgernobyl voador" devido ao risco de, por exemplo, enquanto voa em círculos durante horas a fio e milhares de quilómetros com propulsão nuclear, mesmo que tenha sido alvo de testes rigorosos, nada obsta a que não possa acontecer um imprevisto ligado aos sistema de propulsão e espalhar radiação por onde estiver a passar.
Além dos possíveis acidentes e avarias, os especialistas alertam para a possibilidade de este míssil, por razões de fabrico e forma, poder libertar quantidades de radiação perigosas ao longo do voo, sendo por isso apelidado de "Chernobyl voador".
O britânico The Guardian lembra mesmo que em 2019, naquilo que muitos analistas apontaram como o local onde esta arma estava a ser desenvolvida, aconteceu um incidente grave que matou cinco cientistas russos, deixando uma vasta área contaminada com radiação perigosa.
Esse incidente foi visto na altura pelo Kremlin como uma fase de transição para os testes e o próprio Presidente Putin disse à época que estava a resultar numa arma sem paralelo em todo o mundo que, depois, a NATO viria a baptizar de SSC-X-9 Skyfall (O céu a cair, em português)
Todavia, o anúncio desta nova arma para o arsenal atómico russo, aquele onde mais ogivas nucleares existem, mais de 5.700, algumas centenas a mais que o arsenal norte-americano, cada um deles suficiente para destruir o Planeta Terra centenas de vezes, não pode ser desenquadrado do actual conflito na Ucrânia, onde o Kremlin acusa de estar em guerra por proximidade com os europeus e norte-americanos da NATO e não apenas com Kiev.
E isso mesmo avançou John Erath, que defende que Putin pretendeu com este anúncio gerar preocupação no ocidente, onde estão em curso não apenas vagas de sanções contra a Rússia mas ainda em preparação a mais severa de todas que é o confisco dos mais de 240 mil milhões de euros que Moscovo tem depositado nos sistemas financeiros ocidentais e que foram congelados após a invasão da Ucrânia em 2022.
E em pano de fundo está ainda o constante ziguezaguear de Donald Trump sobre a possibilidade de fazer chegar a Kiev os mísseis Tomahawk que, pelo turbilhão de reacções em Moscovo, parece ser mesmo algo que Putin quer evitar que aconteça e, para isso, alem de ter telefonado ao homólogo norte-americano, que depois levou ao anúncio e cancelamento de um encontro em Budapeste, apresentou agora ao mundo o seu "Chernobyl voador".

