Findo o telefonema com Vladimir Putin, o Presidente dos Estados Unidos correu para a sua rede social, a Social Truth, onde escreveu que ucranianos e russos se iriam sentar face a face para desenhar o formato do cessar-fogo, que estaria praticamente garantido, faltando apenas afinar detalhes.
O mesmo parecia ser o entendimento do chefe do Kremlin, que, também imediatamente a seguir à conversa telefónica histórica com o seu homólogo norte-americano, admitia, em conversa com jornalistas russos, que a Rússia iria tudo fazer para se aproximar de Kiev com vista a um compromisso aceitável para ambos os países onde assentar o cessar-fogo.
Só que, como é nos detalhes que o diabo se esconde, também aqui o detalhe estava à vista de todos mas ninguém se interessou por lhe dar importância, que era perceber até que ponto a Federação Russa tinha amolecido as suas exigências face a Kiev para parar as hostilidades, sendo que estas pouco ou nada mudaram nos mais de três anos de guerra aberta.
Foi Volodymyr Zelensky que, após a conversa telefónica com Trump, reduziu as expectativas para um cessar-fogo e deitou por terra qualquer possibilidade de um acordo de paz para breve, apontando como via mais curta para conseguir resultados concretos aumentar a pressão sobre Moscovo com mais sanções.
Apesar de ter dito que Kiev mantém a abertura para negociar com os russos, Zelensky reiterou que qualquer abandono de pretensões de soberania sobre os territórios actualmente ocupados pela Rússia está fora de questão.
"Se os russos não estão prontos para parar as mortes, então é preciso que lhes sejam aplicadas novos e mais fortes sanções, porque toda a pressão sobre a Rússia é aproximar ao fim do conflito", disse Zelensky, anulando quaisquer possibilidade de avanços concretos e imediatos.
Isto, porque, ao que tudo indica, o Presidente ucraniano, depois de falar com Trump, ficou convencido que Putin não mostrou abertura nenhuma para reduzir as suas exigências já bem conhecidas, incluindo recusar um cessar-fogo sem negociações, como o ucraniano pretende, que Moscovo teme que seja aproveitado pelos aliados europeus para rearmar a Ucrânia...
Que, em síntese, são: o reconhecimento de Kiev e dos seus aliados ocidentais da soberania russa sobre as regiões anexadas desde 2014, a saída das forças ucranianas das áreas destas regiões ainda por conquistar pelas armas, a desmilitarização e a neutralidade fora da NATO, bem como acabar com a ideia do envio de forças ocidentais para a Ucrânia como parte das garantias de segurança.
Enquanto Kiev não desiste de exigir que Moscovo retire todas as suas forças dos territórios internacionalmente reconhecidos como parte da Ucrânia que saiu do desmoronamento da União Soviética, em 1990, incluindo a Crimeia, anexada pela Rússia em 2014, e Kherson, Zaporizhia, Donetsk e Lugansk, anexadas em 2022, o pagamento dos custos da reconstrução por Moscovo e garantias de segurança que passam pela presneça de largas dezenas de milhares de tropas dos países da NATO na UCrânia para travar futuras agressões russas.
Ora, face a este verdadeiro pântano diplomático, onde todos os esforços se parecem afundar, Zelensky optou por desalinhar o seu discurso do optimismo mostrado por Donald Trump, aludindo, mais uma vez, às "exigências irrealistas" de Putin que mostram que o Kremlin "quer manter a guerra a correr" e que só se poderá travar os russos com "mais sanções da Europa ocidental e dos Estados Unidos".
Com esta opção, Zelensky, que conta com o apoio ilimitado e sem prazo dos seus europeus, estando a União Europeia a preparar o seu 17º pacote de sanções para os próximos dias, mostra não estar disponível para quaisquer cedências perante Putin, o que significa que ambos os lados desta guerra estão empenhados em conseguir no campo de batalha os seus objectivos se o outro lado da trincheira não capitular.
Esta postura levou mesmo Donald Trump a referir-se a Zelensky como "alguém com quem é muito difícil de lidar" embora acrescentando que o ucraniano também quer acabar com o conflito, tal como disse que Putin quer... só que ambos querem do outro o que o outro não quer ceder.
Perante este revés no optimismo de Trump, volta a estar em cima da mesa a possibilidade de Washington se retirar da mediação do conflito no leste europeu, como Trump tem ameaçado fazer nos últimos tempos, se, tal como parece evidente, Kiev e Moscovo não cederem nas suas trincheiras negociais.
Alias, Trump deu agora um sinal nesse sentido ao aludir à possibilidade de passar a mesa das negociações para o Vaticano, aproveitando uma oferta nesse sentido do papa XIV, que manifestou a vontade de assumir um papel de protagonista na mediação entre russos e ucranianos.
Para já essa possibilidade ainda não foi accionada em definitivo por Trump e tanto Kiev como Moscovo inistem na sua disponibilidade para avançar nos múltiplos terrenos da diplomacia para afastar um desfecho da guerra nas trincheiras que se estendem por mais de mil quilómetros e onde já terão ficado centenas de milhares de vidas de ambos os lados.