Dando corpo à ideia de que a melhor defesa é o ataque, Volodymyr Zelensky foi às redes sociais anunciar que deu ordens às unidades militares para reforçarem os ataques em profundidade no território da Federação Russa, onde, nas últimas semanas, tem somado sucessos evidentes com explosões em áreas industriais e refinarias a milhares de quilómetros da fronteira.
Isto, num momento em que do lado russo, com uma evidente superioridade no terreno e nos céus ucranianos, com ataques contínuos à infra-estrutura energética do país, quase às escuras e sem aquecimento quando o Inverno já se instalou, se procura conquistar as derradeiras cidades de Donetsk ainda sob domínio ucraniano, como Pokrovsk, onde se desenrolam os maiores e violentos combates, Kupiansk e Kramatorsk.
Mas é neste jogo disputado em cima de uma linha muito fina que Moscovo e Kiev procuram ganhar vantagens, territoriais do lado russo, de pressão internacional, do lado ucraniano, para preparar o que os dois lados começam a assumir como possível: o fim do conflito ainda este ano.
Alguns analistas consideram que os esforços suplementares em curso do lado russo para conquistar os territórios em falta das regiões anexadas, como Donetsk, Kherson e Zaporizhia são um sinal de que em Moscovo se começa a pensar seriamente na possibilidade de negociar a paz com base, embora com adendas graúdas, na proposta de Donald Trump, que é congelar o conflito nas actuais linhas em disputa.
E do lado ucraniano já nem se esconde que o desejo actual mais forte é terminar os combates nas actuais linhas da frente, com um cessar-fogo, estando em preparação, anunciou Zelensky em Kiev, um plano elaborado com a ajuda dos aliados europeus para apresentar ao Kremlin dentro de 10 dias.
Embora em Moscovo ainda não se tenha ouvido qualquer declaração a considerar acabar o conflito sem, como insiste Putin há longos meses, abordar as suas causas profundas, desde logo a "desnazificação" do regime ucraniano, a neutralidade e o reconhecimento da soberania russa das regiões anexadas em 2014 (Crimeia) e 2022, as outras quatro... a verdade é que também se tem notado uma vontade crescente para chegar à paz.
E isso percebe-se com a recente aposta do Kremlin em falar com a Casa Branca, enviando o conselheiro especial de Putin para a área económica, Kirill Dmitriev, a Washington, ou o telefonema do Presidente russo a Donald Trump há dias, ou ainda nos constantes apelos para que os EUA evitem uma escalada militar com o envio dos mísseis Tomahawk para Kiev, o que iria estrangular as escassas possibilidades de paz...
Além disso, atendendo ao que escreve esta terça-feira, 28, The Guardian, ou o Financial Times, a Rússia tem pela frente um dos momentos mais complexos para lidar no contexto das vastas sanções aplicadas pelo ocidente nestes quase quatro anos de guerra, que foram as aplicadas agora por Trump às multinacionais russas do crude, Rosneft e Lukoil, devido ao impacto que estas estão a ter nos mais relevantes clientes da energia russa, a China e a Índia... de onde estão a chegar em catadupa cancelamentos ou a suspensão de encomendas...
Ao mesmo tempo que em Kiev Zelensky insiste na ameaça de ataques alargados à infra-estrutura petrolífera russa, garantindo que que "a refinação de petróleo russa já está a pagar um preço tangível pela guerra e vai pagar ainda mais", disse, referindo-se aos recentes ataques ucranianos com drones, depois de assumir problemas incapacitantes na produção do seu míssil de longo alcance "Flamingo".
O líder ucraniano acrescentou que o Governo está a negociar contratos de longo prazo com empresas de armamento para garantir "maior previsibilidade na alocação de recursos" e "um aumento sustentado da produção militar", num tom claramente destinado a ameaçar a Rússia no seu frenético desejo de conseguir que Putin aceite um cessar-fogo para o libertar da pressão russa esmagadora na linha da frente.
Este cenário pode ter ainda desenvolvimentos mais céleres quando, ainda segundo The Guardian, devido às sanções norte-americanas, a privada Lukoil, o gigante da energia russa, anunciou que o impacto das sanções está a obrigar à venda dos seus activos no estrangeiro, tendo o processo já começado, recordando o jornal que as medidas sancionatórias da Casa Branca incluem o congelamento dos fundos da empresa nos EUA, abrangendo também a estatal Rosneft. A Lukoil e a Rosneft são responsáveis por 55% da venda global do crude russo.
Entretanto, como vários analistas já sublinharam, a resolução do conflito ucraniano só poderá ser conseguida pela via das negociações assente num acordo abrangente entre a Rússia e os EUA, de modo a que Kiev fique sem espaço para aguentar o esforço de guerra, ou pela via da continuação da guerra até à derrota de uma das partes.
E a recente divulgação dos testes bem-sucedidos da nova arma-maravilha russa, o Durevestnik, míssil de alcance ilimitado, nuclear e com propulsão igualmente nuclear, que Putin usou como advertência a Washington para as tentativas de esmagar a capacidade militar russa, desagradou fortemente a Donald Trump, como este enunciou durante a sua deslocação para a reunião da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) na Malásia, de 26 a 28 deste mês de Outubro.
Trump não apenas mostrou desagrado para com o anúncio de Putin desta nova arma, como fez questão de lhe lembrar que "melhor seria ele (Putin) acabar com a guerra" onde morrem milhares de militares todas as semanas, avisando os russos que os EUA não precisam deste tipo de armas quando possuem os melhores submarinos nucleares do mundo.
Lembrou Putin que este trava "uma guerra que deveria ter durado uma semana e está prestes a entrar no quarto ano. É isso que ele deveria fazer em vez de testar mísseis", acrescentando: "Eles sabem que temos um submarino nuclear, o melhor do mundo, bem na costa deles. Não precisam voar 14 mil quilómetros. Eles não estão a brincar connosco e nós também não estamos a brincar com eles".
Recorde-se que já antes, o Presidente norte-americano ironizou com Putin, quando este disse que as sanções não afectarão a Rússia, desafiando-o a voltar a falar no assunto "daqui a seis meses" para ver as sanções são eficazes ou não.
Apesar dos zigue-zagues de Trump aproximando-se a afastando-se de Putin e de Zelensky, somando todos esses momentos, começa a ser evidente que o norte-americano está a distanciar-se do russo de tal forma que a retoma do diálogo com o Kremlin começa a parecer menos viável a cada dia que passa.
Um momento fundamental para se perceber os próximos passos de Donald Trump será o encontro desta semana, na Malásia, com o Presidente chinês, Xi Jinping, visto como mais uma etapa do esforço norte-americano para desligar a "energia" que mantém viva a parceria "sólida como uma rocha" entre Pequim e Moscovo.

