Esta operação levou a um período de tensão entre os Governos de Luanda e de Kinshasa, alimentada por relatos de alguns dos expulsos sobre alegada violência exercida pelas forças de segurança para os obrigar a deixar o país.

Estas acusações foram veementemente negada pelas chefias policiais e pelo ministro de Estado e Chefe de Segurança do Presidente da República, general Pedro Sebastião, que coordena a operação.

Em processo de diluição desta tensão entre Kinshasa e Luanda, as atenções centram-se agora do outro lado da fronteira, com o aglomerar de milhares de pessoas sem condições de acolhimento e no detalhe das explicações para que Angola tenha optado por esta solução radical para, segundo as explicações oficiais, "regularizar o comércio e exploração de diamantes", com destaque nas províncias fronteiriças das Lundas, Bié e Malanje, e ainda com o objectivo de controlar os fluxos migratórios.

Para já, segundo, Pedro Sebastião, no decurso desta operação, foram apreendidos mais de um milhão de dólares em diamantes, dezenas de armas de fogo e cerca de duas centenas de postos de compra e venda de diamantes em situação ilegal foram desmantelados.

Esta é, segundo as autoridades nacionais responsáveis por esta operação, a razão de primeira linha para o continuado abandono do país por milhares de ilegais diariamente, porque deixaram de ter quaisquer razões para se manterem no país.

Recorde-se que esta operação, que só começou há cerca de um mês, vai manter-se pelo menos até 2020, o que pressupõe que as autoridades angolanas estabeleceram este prazo para regularizar a situação migratória no país, adivinhando-se que depois das áreas diamantíferas, a atenção se vá virar para outras áreas de grande concentração de imigrantes ilegais, nomeadamente Luanda.

Pelo meio deste esforço emergiram diversos relatos de perseguições violentas a ilegais, alegações de natureza xenófoba por detrás da "limpeza" ou ainda de mortes entre os expulsos, como chegou a ser noticiado por alguns media internacionais e congoleses, tudo negado pela parte angolana e aceite por Kinshasa, depois de o Ministério das Relações Exteriores (MIREX) ter chamado o embaixador da RDC em Luanda para falar deste assunto e de o embaixador angolano em Kinshasa também ter sido convocado pelo Governo de Joseph Kabila, que, ainda assim, criou uma comissão intergovernamental para analisar a situação.

A ONU, através do ACNUR, agência para os refugiados, lançou um alerta sobre a crise humanitária no Kasai, província congolesa para onde se dirigiram muitos milhares de congoleses oriundos de Angola.

Apesar desta relativa acalmia nos corredores diplomáticos, com deslocações, por exemplo, do ministro Pedro Sebastião ao posto fronteiriço de Chissanda, na Lunda Norte, com um discurso apaziguador e com explicações oficiais, como Kinshasa exigia, a agência de notícias AFP relatou diversos episódios de brutalidade exercida sobre grupos de congoleses que se recusavam a sair, casas incendiadas pela polícia e por gangues locais, agressões com catanas, entre outras acusações.

Outra questão que está a "incendiar" os ânimos, nomeadamente nas redes sociais, são imagens gravadas em vídeo com a bandeira angolana, empunhada por grupos de congoleses, a ser queimada, embora, ao mesmo tempo, tal gesto seja minimizado por se tratar de uma mera reacção ao sucedido e não uma acção de maior envergadura contra Angola.

Por detrás da "transparência"

Ao falar publicamente sobre esta matéria no posto fronteiriço do Chissanda, na província da Lunda-Norte, Pedro Sebastião reforçou que o objectivo da "Operação Transparência" é "criar condições para o controlo efectivo de uma das grandes riquezas do país, o diamante".

Defendendo que a exploração diamantífera deve acontecer "de acordo com as leis e regras em vigor", evitando que o país seja considerado como um "El dorado" pelos imigrantes ilegais", o responsável reforçou que a "Operação Transparência", da qual é coordenador, "não tem como base qualquer motivação ou sentimentos ocultos contra cidadãos do país vizinho ou de outra nacionalidade".

Foi igualmente frisado que não existem ou existiram "quaisquer actos de violência por parte das autoridades que compõem os órgãos de Defesa e Segurança, actos susceptíveis de violação dos direitos humanos contra cidadãos da República Democrática do Congo".

Como pano de fundo para este cenário está uma realidade antiga e por todos conhecida, que é o caos em que a extracção e comercialização de diamantes é feita em algumas áreas diamantíferas, nomeadamente na Lunda Norte e Lunda Sul, com a existência de relatos sobre a alegada existência de ligações a redes criminosas que se servem deste comércio para financiarem organizações visadas, por exemplo, no âmbito do terrorismo internacional.

Apesar de não haver dados concretos sobre as perdas anuais para o Estado angolano em impostos sobre este comércio, estima-se que estas ascendam a dezenas de milhões de dólares que se diluem nas redes ilegais que operam nestas áreas, cujos pilares em que se sustentam são as casas de receptação dos diamantes extraídos, muitas delas geridas por estrangeiros, para além de congoleses, por senegaleses, libaneses, Nigerianos entre outros.

Resultados em números

Com esta operação, até ao momento, segundo o comissário António Bernardo, da Polícia Nacional, foram apreendidos mais de 16 mil quilates em bruto, no valor superior a um milhão de dólares, tendo sido encerradas cerca de uma centena de cooperativas de garimpo ilegais e outras tantas casas de compra de diamantes.

As denominadas cooperativas são constituídas por grupos de garimpeiros que se juntam e, nalguns casos, através de financiamento com origem nas redes que gerem a área de compra das "pedras", adquirem os equipamentos para escavar terra ou limpar as áreas dos rios, sob compromisso de cedência de privilégio na venda das gemas.

Para além dos diamantes e dinheiro apreendidos, as autoridades nacionais apreenderam ainda viaturas, motorizadas e carrinhas todo-o-terreno, armas de fogo de diversos calibres

O comissão da PN explicou no Comando Municipal do Lucapa, província da Lunda Norte, que os responsáveis pela aquisição das perdas oriundas do garimpo, recorriam a expedientes curiosos para atrair vendedores e, assim, maximizar os lucros.

Segundo António Bernardo, estes indivíduos chegavam a oferecer carros ligeiros a quem lhes levasse pedras no valor de 5 mil dólares, mas as recompensas eram exponenciadas de acordo com o valor dos diamantes, podendo ir até à oferta de luxuosos Land Cruiser se as gemas valessem mais de 15 mil dólares.

Estes valores são a referência local, presumindo-se que o seu valor nas redes internacionais teria sempre de compensar a oferta de um veículo que pode superar os 70 mil dólares.

Uma outra questão é que, sem controlo, como este negócio decorria até aqui, jamais se saberá se não terão sido "exportados" de Angola alguns diamantes de prestígio mundial, que poderiam potenciar todo o sector diamantífero, e são normalmente notícia nos sites especializados, seja pela dimensão ou pela cor e brilho.

É disso exemplo o que sucedeu em 2016, quando na mina do Lulo, na Lunda Norte, foram descobertos diamantes com centenas de quilates, incluindo o maior de sempre, com 404 quilates, o que permitiu que todas as outras pedras, mesmo de reduzido peso, atingissem valores elevados nos mercados internacionais, empurrados para cima pelo prestígio dos pesos-pesados, batendo mesmo o recorde mundial nesse ano, chegando a uma média de 2 983 USD por quilate.