Parecia mesmo que o Kremlin estava a aumentar a agressividade ao "atacar" com misseis ou drones o edifício do Governo ucraniano em Kiev, com imagens a correr mundo com os bombeiros a extinguir as chamas que consumiam a sede do Governo ucraniano.

Com essas imagens em pano de fundo, o Presidente Volodymyr Zelensky publicou mais um vídeo onde pede aos aliados europeus e norte-americanos que reforcem os castigos à Rússia com mais sanções e tarifas a Moscovo, mas essencialmente com mais armas para Kiev.

E a primeira-ministra ucraniana, Yulia Svyrydenko, não perdeu tempo a secundar o seu Presidente e a acusar os russos de um ataque directo à sede do seu Governo (ver fotografia), o que seria quebrar uma regra não escrita que, até agora, ao fim de mais de três anos e meio, o Kremlin nunca trespassara: atacar edifícios da Presidência e do Governo da Ucrânia, apesar de ser famoso o ataque ucraniano ao Kremlin, em Moscovo, com um drone abatido já dentro da Presidência russa...

E os media ocidentais, quase em uníssono, reverberaram as palavras de Zelensky e Yulia Svyrydenko, acusando Vladimir Putin de uma séria escalada no conflito numa toada visando claramente apelar ao Presidente dos EUA, Donald Trump, para mudar para um "chip" mais agressivo para com o seu "amigo" Putin.

Só que, de novo, porque tal já aconteceu várias vezes desde que a Federação Russa invadiu a Ucrânia, em 2022, depois de uma longa guerra civil no leste pró-russo ucraniano, após o golpe de Estado de 2014, apoiado pelos EUA, em Kiev, que destituiu o Presidente aliado dos russos, também este "ataque" foi desmentido internamente, na capital ucraniana.

Depois de a Rússia ter negado o ataque ao edifício-sede do Governo em Kiev, o que foi totalmente ignorado pelos media ocidentais, eis que o presidente da câmara de Kiev, Vitali Klitschko, um conhecido e dos mais destacados líderes da "revolução" anti-russa de 2014, veio corroborar a versão de Moscovo.

Afinal, afirmou Vitali Klitschko, citado pelos próprios media do país, o que ateou fogo na sede do Executivo em Kiev foram os destroços de um drone russo abatido pela anti-aérea ucraniana durante o ataque de Sábado, para Domingo, 07, que foi, claramente, um dos mais severos de sempre, com quase 800 drones e mísseis de longo alcance russos.

Embora seja já claro que os russos não atacaram directamente o edifício governamental em Kiev, em Washington, Donald Trump optou por ignorar essa informação e, questionado pelos jornalistas, disse estar furioso com esse ataque dos russos e que estava "pronto para avançar com renovadas sanções" a Moscovo, mesmo que antes tenha dito estar consciente de que estas não têm qualquer impacto na economia russa.

Alias, o ataque em número record de drones e mísseis deste fim-de-semana é, mesmo que não se confirme o míssil na sede do Executivo, uma escalada russa e surge no "day after" à viagem de Vladimir Putin à China, onde esteve com o Presidente Xi Jinping e dezenas de outros líderes na Parada Militar do Dia da Vitória, que marca o 80ª aniversário do fim da II Guerra Mundial para os chineses.

Nessa estadia em terras chinesas (ver links em baixo), Putin e Xi renovaram os laços da sua "parceria sólida como uma rocha" e aos russos foram dadas manifestações múltiplas de apoio mais ou menos ilimitado da China, Coreia do Norte, Irão, Índia, embora neste caso apenas na forma de desafio ao ocidente recusando as ordem de Washington para Nova Deli parar de comprar crude russo.

Furioso com a postura desafiadora do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, que em Tianjin, no contexto da reunião da Organização para a Cooperação de Xangai (CSO), fez-se fotografar e filmar com Putin e Xi naquele que será o eixo (Pequim-Moscovo-Nova Deli) que mais assusta o Ocidente (EUA-Europa Ocidental) no que muitos analistas já admitem ser um "manifesto" de reivindicação da efectivação da Nova Ordem Mundial, Trump ripostou com uma rajada de ameaças aos três, incluindo novas tarifas, para já "apenas" a russos e indianos...

E esse esticar de corda por parte de Trump pode ficar já a perceber-se esta semana, quando, menos de duas semanas depois dos líderes europeus terem ido, com Zelensky, em fila "indiana" para Washington pedir a Trump que deixe em definitivo de procurar entendimentos com Putin e opte pela via mais agressiva da anterior Administração de Joe Biden.

Nesse novo encontro com os europeus, Donald Trump deve apresentar uma nova forma de líder com os russos, sendo que o mais certo é apresentar novas sanções, especialmente às exportações de energia, embora essas já pouco cheguem ao Ocidente, especialmente os europeus, que são quem pode ver-se obrigado a optar total e unicamente pelo petróleo e gás americano, que chega a ser 4 vezes mais caro que o russo.

Porém, esta cavalgada sancionatória de europeus e norte-americanos pode ser ligeiramente ou muito alterada com os acontecimentos políticos na Europa, que atravessa não apenas uma crise económica de largas proporções, em grande medida devido ao corte na compra de energia russa barata e abundante no contexto das sanções devido à invasão russa da Ucrânia.

Isto, porque se na Alemanha e no Reino Unido as coisas estão a ferver devido às fragilidades crescentes da sua economia, com os Governos do chanceler Fredrich Merz, e do primeiro-ministro Keir Starmer, pressionados por uma popularidade negativa em níveis recorde.

Mas, em França, onde o cenário económico é o mesmo, uma crise política já está nos braços do Presidente Emmanuel Macron, que tem, neste momento, no Parlamento, a possibilidade da queda do seu Governo, pela segunda vez em menos de um ano, devido a uma moção de confiança que apresentou mesmo sabendo que será, sem um milagre, ser aprovada.

Alguns analistas notam que se está a observar um jogo de grande risco e melindre em que o tempo parece ser a arma principal, com os europeus à tentarem ganhar os meses necessários na expectativa de que, apesar de FMI e Banco Mundial terem avançado com dados contrários, a economia russa colapse, enquanto em Moscovo, se procura consolidar posições na expectativa de que as fragilidades europeias "abatam" os "falcões" anti-russos europeus.

Este será um dos temas para a agenda da reunião de Donald Trump com os seus aliados europeus, que, na recente visita à Casa Branca, foram expostos a uma situação que muitos consideraram humilhante, perfilados no corredor enquanto o anfitrião falava com Zelensky, e depois sentou-os à sua frente na Sala Oval em clara posição desconfortável e secundarizada...

O que dali vai sair será decisivo para o futuro das relações dos Estados Unidos com a Federação Russa, mas se será uma vitória dos europeus, apesar dessa expectativa ser evidente, ver-se-á nos próximos dias.

Mas há um sinal dado este fim-de-semana por Zelensky que pode ser contraditório com a efusividade do seu vídeo promocional diário, que foi, em entrevista à NBC, d eonde aparece citado pela RT, ter afirmado que uma vitória ucraniana na guerra seria conseguir que os russos não conquistem o país todo.

Isto, porque, como Zelensky tem dito amiúde, o que pode ser visto igualmente como garantir que deixa sempre uma janela aberta para por ela sair airosamente em caso de derrota militar, as intenções de Vladimir Putin são tomar toda a Ucrânia e não apenas o leste do país, como, efectivamente, o Kremlin insiste que é o objectivo úinico da sua "operação militar especial".

É ainda relevante o facto de, pela primeira vez em muito tempo, os russos terem atacado uma das várias pontes sobre o Rio Dniepre, que separa, literalmente, o oeste do leste ucraniano e que, se Putin optar, o que ainda não fez nem parecia que seria uma possibilidade, destruir este conjunto de travessias, não apenas a população fica sem acesso entre os dois lados como a logística militar para a frente de guerra perde toda a viabilidade...

Alguns analistas admitem que este "recado" dado pelo chefe do Kremlin é a razão para o aparente reposicionamento estratégico de Zelensky que admite agora ficar satisfeito se os russos não tomarem o país todo.