Se o Presidente Donald Trump ceder os Tomahawk a Volodymyr Zelensky, no Kremlin, Vladimir Putin já avisou que passará o conflito para outro patamar de risco e dará por findo o processo de retoma das relações com os Estados Unidos da América.

Isto, apesar de a possibilidade de os EUA enviarem os misseis Tomahawk, com um alcance de 2.400 kms, e com capacidade para alternar entre ogivas convencionais e nucleares, ser muito reduzida.

Porque, como sublinha o major-general Agostinho Costa, ainda não está totalmente desenvolvida a plataforma de lançamento terrestre destas armas que são, até agora, de uso exclusivo de navios e submarinos.

Todavia, Donald Trump resolveu esta semana apimentar o momento admitindo que pode mesmo enviar Tomahawk para Kiev, embora tenha tirado, ao mesmo tempo, o pé do acelerador ao sujeitar essa decisão final a "algumas perguntas que terá de fazer antes".

O Presidente norte-americano insistiu que não quer "escalar o conflito", mesmo que seja precisamente isso que significará se estes misseis estratégicos chegarem às mãos dos ucranianos, porque o próprio Zelensky já disse que os vai usar para "apagar" Moscovo.

Quais são as perguntas que Trump quer ver respondidas antes de dar o passo que nem o seu antecessor, Joe Biden, um "falcão de guerra" de garras afiadas no dorso do "urso" russo de atreveu, ficou por perceber, mas serão dirigidas ao secretário-geral da NATO e não a Kiev.

Isto, porque a Casa Branca já disse e repetiu que não vai dar mais armas aos ucranianos, apenas as venderá à NATO - organização militar que é liderada por Washington mas Trump parece querer esquecer ou ignorar - e depois estes farão com elas o que entenderem.

Mas, aparentemente será saber se Zelensky usará os Tomahawk para atingir, por exemplo, o Kremlin, num golpe de decapitação do regime russo, que levaria de imediato a um Armagedão nuclear? Se serão usadas para atacar edifícios de relevância estratégica na Federação Russa?, o que seria igualmente caminho para um confronto atómico...

... ou Zelensky vai querer os Tomawahk, para infligir danos sulfurosos na infra-estrutura energética russa, impedindo Moscovo de continuar a vender crude e gás à China e à Índia, com os proveitos a garantirem o financiamento da guerra no leste europeu?

Seja qual for a resposta, em Washington, como nota amiúde, por estes dias, o antigo conselheiro do secretário da Defesa norte-americano no primeiro mandato de Donald Trump, coronel Douglas McGregor, "alguém não está a calcular bem o que está em causa".

É que, alerta este militar norte-americano, com obra publicada sobre a estratégia geopolítica em torno de conflitos internacionais, em Moscovo, Vladimir Putin e os seus conselheiros e especialistas, não olham para estes misseis como uma arma convencional.

Douglas McGregor nota que estão obrigados a encarar este tipo de misseis como aquilo que eles são de facto: um míssil nuclear que pode ser usado para um ataque de decapitação do Governo da Federação Russa e existem riscos associados que "não podem ser ignorados".

Quem não ignorou essa possibilidade, mesmo que se trate de um "bluff", algo que faz parte da retórica em que as potências se testam nos limites, foi Vladimir Putin que, como raramente sucede, se pronunciou duas vezes em 48 horas sobre as consequências desse passo.

Putin chamou a atenção, no Fórum Económico de Valdai, em São Petersburgo, e depois em entrevista à Russia-1, para a necessidade de uma resposta adequada, sem explicar qual, mas detalhando que o processo de reatamento das relações com os EUA terminaria de imediato.

A grande questão, como os analistas referem cada vez em maior número, é que tipo de reacção terá a maior potência nuclear do mundo face ao disparo de um míssil com potencial nuclear em direção à sua capital, quando é tecnicamente impossível de saber se este carrega uma ogiva convencional ou nuclear?

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, sobre este tópico, não apenas reafirmou a escalada que representaria a chegada destas armas à Ucrânia no campo de batalha, mas também no que isso significaria de negativo no contexto da segurança global.

Para enfatizar este último ponto, Peskov notou com veemência que os Tomahawk não têm escrito no corpo do míssil se transporta uma ogova nuclear ou convencional... e tudo o que isso significa para a segurança russa e que tipo de contra-medidas tal cenário exigiria.

Na conversa esta semana em Washington com os jornalistas, Donald Trump parece estar a recuar, porque ao admitir que antes de dar o aval definitivo ao envio de mísseis Tomahawk para a Ucrânia tem de fazer algumas perguntas, está a dizer que se as respostas não o satisfizerem, abortará o despacho destas armas para a Europa.

O que deixa em cima da mesa como decisão única negar o pedido de Zelensky, porque este já disse publicamente que não hesitará em atacar Moscovo com estas armas com o objectivo de "apagar" Moscovo, no sentido de deixar a capital russa às escuras...

Quanto ao risco de os BGM-109 Tomahawk que vierem a ser, se o forem, entregues a Kiev serem equipados com ogivas termonucleares, naturalmente que não existe, mas o efeito pode ser, ainda assim, arrasador, visto que o seu poder destrutivo é quase lendário.

Basta recordar o efeito das explosões por eles provocadas na Guerra do Golfo, em 1990, sobre o então Palácio de Saddam Hussein, depois de disparados dos navios norte-americanos estacionados no Golfo Pérsico em que essas imagens correram o mundo nos ecrãs da CNN International...

Desenvolvidos nos anos de 1970 pela indústria militar norte-americana, os BGM-109 Tomahawk, misseis de cruzeiro, mais lentos que os balísticos, mas de maior manobrabilidade e pontaria, estão já longe de ser a arma temida que foi outrora.

Agostinho Costa está mesmo convencido, como explicou recentemente na CNN Portugal, que dificilmente podem ser uma arma que altere a realidade da guerra no terreno, onde a Ucrânia está claramente em perda severa e em risco de colapso das suas múltiplas frentes.

Os petroleiros "porta-drones"

Entretanto, em Kiev, Volodymyr Zelensky pressiona cada vez mais os seus aliados europeus, a quem já chegou mesmo, na semana passada, a acusar de estarem numa letargia inexplicável e a roer a corda sobre os compromissos de apoio militar que assumiram, para aumentarem a pressão sobre Moscovo.

Além de mais armas, especialmente na defesa anti-aérea, onde os sistemas norte-americanos Patriot começam a mostrar uma perigosa ineficácia face aos mísseis russos, não apenas os hipersónicos Kinzhal ou Zircon, mas também perante os altamente manobráveis Iskander-M, Zelensky quer mais dinheiro.

Para isso, espera que os líderes europeus concretizem o que têm dito em público sobre o uso dos mais de 200 mil milhões de euros russos congelados nos bancos europeus desde 2022, após o começo da invasão russa, permitindo a Kiev usar esse dinheiro para financiar o conflito.

E agora, quando já usou quase todos os argumentos e esse passo não surge por parte da presidente da Comissão Europeia, Ursula Leyen, Volodymyr Zelensky aposta quase tudo no argumento da frota fantasma de petroleiros que a Rússia usa para continuar a vender crude em todo o mundo.

Mas não é por esse motivo, até porque a frota-fantasma do Kremlin é conhecida há muito tempo, é porque, segundo o Presidente ucraniano, os russos estão a usar estes navios como "porta-drones" que estão a ser lançados sobre os países da NATO no norte da Europa.

Em todos os media ocidentais, e nas palavras dos líderes europeus, a Rússia é quem está pode detrás dos aparecimentos de drones sobre aeroportos e bases militares na Noruega, Dinamarca, Suécia e Alemanha.

Isso, mesmo que quase todos estes episódios tenham sido provocados, confirmadamente, por indivíduos com canais nas redes sociais que usam esse tipo de imagens para produzir conteúdos sem qualquer ligação à Rússia, sendo alguns mesmo detidos em flagrante pela polícia.

Embora não existam quaisquer provas inequívocas de que não exista, ou exista, uma mão russa nalguns destes casos, e também no episódio dos drones-engodo, sem carga explosiva, detectados sobre os céus da Polónia há duas semanas, para Zelensky só a divisão interna entre os países europeus da NATO está a travar uma resposta adequada a Moscovo face a estas "provocações".

Isto, porque Zelensky não tem dúvidas de que os russos estão a usar estes meios para recolher informação e preparar sabotagens, sendo o recurso à frota-fantasma o último método do Kremlin para penetrar as defesas ocidentais.

E no dia 1.322 da guerra...

Parecendo pouco incomodado com a pressão de Zelensky sobre europeus e norte-americanos, Vladimir Putin, depois de semanas a fio de insistência dos media ocidentais e dos seus especialistas militares em que a Rússia não está a progredir no terreno da guerra, vem agora explicar com números que estão todos errados.

O chefe do Kremlin fala em 5 mil kms2 capturados à Ucrânia só este ano de 2025, sublinhando, em entrevista aos media russos, que é Moscovo que tem actualmente toda a iniciativa estratégica no campo de batalha.

Este dado avançado por Putin tem, no entanto, um senão. Ou é a Rússia a dar uma resposta estratégica aos detractores da sua capacidade militar efectiva ou representa uma mudança de estratégia no terreno.

Isto, porque até agora, depois de quase 4 anos de conflito aberto, iniciado em Fevereiro de 2022, tanto as chefias militares russas, como os analistas militares mais próximos da linha russa, insistem que a lógica militar para a Federação não é a conquista de territórios mas sim a destruição da capacidade militar, equipamento e pessoal, do inimigo.

Com este sublinhado aos 5 mil kms2 conquistados em 2025, o Presidente russo está, mesmo que temporariamente, a confirmar que a ocupação territorial é, afinal, importante para Moscovo e que esse factor não tem sido devidamente empolado porque as conquistas têm sido, efectivamente modestas...

A arma secreta "Merkel"

E quando já ninguém se lembrava da antiga chanceler alemã Angela Merkel, esta, numa entrevista ao Partizan, um canal do YouTube húngaro, vem agora acusar a Polónia e os Países Bálticos - Estónia, Lituânia e Letónia - de serem os responsáveis pela guerra entre ucranianos e russos.

Isto, contado pela própria, é assim porque em 2021, quando "já era claro que Putin não estava a levar a sério as negociações" sobre os Acordos de Minsk, que procuravam solucionar as questões mais prementes da disputa no leste ucraniano, especialmente no Donbass, historicamente uma geografia russófila e russófona, estes Estados "recusaram criar uma linha de diálogo diferente" com Moscovo.

Foram os líderes bálticos e polacos que recusaram as conversações propostas pela Alemanha nesse ano de 2021, poucos meses antes da invasão russa, entre a União Europeia e a Federação Russa, o que conduziu à situação vista como de paz inviável pelos russos.

Recorde-se que foi a mesma Angela Merkel que há dois anos veio a público, naquilo que foi secundada pelo igualmente antigo Presidente francês, François Hollande, dizer que os Acordos de Minsk, de 2014, visaram apenas "ganhar tempo" para armar a Ucrânia pela NATO de forma a que esta pudesse estar em condições de se bater e derrotar a Rússia.

Os Acordos de Minsk de 2015 surgem depois do golpe de Estado em Kiev que afastou, pela força, organizado e financiado directamente pelos EUA, com apoio europeu, o então Presidente Viktor Yanukovich, que defendia um alinhamento amigável com Moscovo sem desistir da adesão à União Europeia.

Tal como nessa altura, quando falou da traição a Moscovo na forma dos acordos de Minsk, como agora, quando acusa os quatro países europeus de serem responsáveis pela guerra, a ex-chanceler alemã está a enfurecer os líderes europeus.

As críticas a Merkel são alargadas, mas o antigo primeiro-ministro polaco, especialmente visado, vem responder dizendo que as declarações da antiga chanceler "são uma vergonha", feitas por alguém "de uma arrogância sem limites".

Mateusz Morawiecki acusou ainda Merkel de ser responsável por uma política que kevou à dependência europeia da energia - gás e crude - russos e de desarmamento perigoso da União Europeia.

Isto, apesar de na Alemanha estar a crescer um movimento de contestação à guerra e ao apoio a Kiev porque cada vez mais jornais e sites especializados se referem à crise económica severa que se instalou no país, e em quase toda a Europa ocidental, como estando intrinsecamente ligada ao fim do gás e petróleo russos baratos, que permitiam manter em alta a competitividade económica.

O fim do acesso à energia barata russa, trocada pela norte-americana, no caso do gás, quatro a cinco vezes mais caro, e pelo crude do Médio Oriente e americano, igualmente mais dispendioso, está, por exemplo, a levar ao colapso da indústria química alemã, a mais poderosa na Europa, e à saída de grandes unidades industriais, como a do aço e a do sector automóvel, para outras geografias, desde logo os EUA.